" Uma aberração jamais conhecida pela humanidade viva, uma criatura saída dos pesadelos de uma criança doente "
Era uma noite calma, calma e silenciosa. As estrelas revelavam o caminho. O vento soprava suave e trazia uma mistura de aromas tão forte que seria capaz de enlouquecer o faro de um cão caça, o salgado perfume do mar com nauseante cheiro do rum, pra completar, o fedor do mofo mesclado ao suor dos homens que trabalhavam no convés. Era uma noite calma, e isso deixava os marinheiros assustados, você sabe o que esperar de noites escuras e tempestuosas, noites calmas são cheias de surpresa, deixa até o mais experimentado comandante angustiado. Era uma noite calma, ouvia-se o rugido do mar quebrando no casco da proa, sabe-se lá porquê diabos os homens não cantavam, apenas bebiam e trocavam olhares desconfiados. Dever ser o tirocínio de anos de navegação, não sabíamos o que esperar, mas tínhamos certeza que deveríamos aguardar, era uma noite calma e normal, e não há nada mais perigoso para um homem livre do que isso. Não sei de onde veio nem como apareceu, mas em menos de um segundo estávamos envoltos de um nevoeiro, uma cortina cinza, densa e pesada, capaz de encharcar os espartilhos por baixo do vestido de uma puta. Percebi a agitação no convés, os olhos desconfiados de antes agora arregalados de medo. Berrei para os sacos de pulgas e piolhos que controlavam as velas: “Atenção, vermes fedorentos, muita atenção, eu não sei de onde diabos surgiu a merda desse nevoeiro, por isso diminuam a velocidade e todos com a porra da atenção redobrada”. Num baque mudo o navio simplesmente parou, foi travado, não houve batida, era como se simplesmente tivesse atolado num amontoado de lama espessa, mas não havia lama alguma. Um grito que veio da amura inundou o convés, um grito desesperador saído de âmago da alma, um grito de um homem que viu o teratismo do pior dos infernos possíveis de existir. Então todos começaram a gritar, todos com mãos nos ouvidos querendo deixar de escutar o que quer que estivesse sendo falado. Então de dentro da minha cabeça veio o som gutural e profano, inidentificável e absolutamente impossível de descrever ou replicar. Como surgiu se foi, o mundo havia ficado mudo, ou eu estava surdo? Não sei. Então a criatura surgiu, uma monstruosidade imensa, uma aberração jamais conhecida pela humanidade viva, uma criatura saída dos pesadelos de uma criança doente, o próprio satanás deve ser algo mais agradável aos olhos. Meus homens pareciam dominados por um transe ou possuídos, tinham os olhos virados, mostrando somente o branco, de seus narizes escorria sangue e alguns vomitavam vermes, insetos e outros parasitas. Instintivamente corri para um bote berrando pra meu imediato arriar as cordas que o prendiam, foi tudo muito rápido. Não sei como, nem o porquê, mas conseguimos fugir. Acordei desmaiado na praia de um vilarejo, Hjioram, meu imediato estava morto ao meu lado, tinha sangue no seco abaixo do nariz. Os horrores da noite não saíam da minha cabeça. Desde então, sonho sempre com isso, e neste sonho, ou melhor, neste pesadelo, estou navegando numa noite calma, tudo se repete.
- Conto escrito pelo aventureiro: Danilo Iancoski Gonçalves, no grupo oficial da pág, O Arcanum!
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